sábado, 7 de outubro de 2017

De pirilampos e cigarras

  
Não estou certa se primeiro se foram os pirilampos ou as guaviras. O fato é que seus ciclos e presença entrelaçavam-se com as nossas próprias vidas. Estavam ali, conosco, como tudo o mais que tomava parte daquele pequeno mundo. Em novembro, o gosto doce das frutinhas redondas e esverdeadas era tão certo quanto as luzinhas piscando-piscando dos pirilampos à frente da casa, no cair da tarde.

Um dia começaram a chegar os tratores às fazendas vizinhas. Ajudariam a ampliar a produção na lavoura. Melhorariam o pasto para o gado. Aos poucos, a vegetação dos campos foi sendo modificada. Quando nos demos conta, já não havia pirilampos. Tampouco guaviras. Hoje nem eu posso pisar aquele chão vermelho-tinta. Mas essa é já outra história.

Quando vim de lá, um dos assuntos recorrentes durante a primavera, na capital federal, eram as cigarras. Amadas por uns, odiada por outros, compunham, obrigatoriamente, a trilha sonora dos meses de setembro, outubro, novembro. Umas com trinados mais agudos, outras graves e compassadas. Algumas cantavam noite adentro, outras na madrugada, e todas em pleno calor do dia.

Um dia, apareceram os pássaros pretos. Andavam rente ao chão, à espreita, prontos para saborear cabeças de cigarras desavisadas. Começaram a ser vistos corpos decapitados dos insetos cantantes. Os pássaros aprenderam rapidamente a esperar que elas emergissem da terra e passaram a devorá-las antes mesmo de deixarem suas cascas nos troncos das árvores.

Em 2017, outubro adentro, ainda não ouvi um trinado sequer de cigarra.

Buscando informações, descobri que um número enorme de insetos está na lista da fauna em risco de extinção: borboletas, abelhas, grilos, gafanhotos, pirilampos... e as cigarras... Efeitos do avanço das cidades, e da agricultura intensiva. Uma tragédia ambiental da qual não temos ainda noção das dimensões.

E eu pergunto: quem chamará as chuvas?





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